A NOVA NAÇÃO

Andreas Kisser (Sepultura)
O Sepultura é a banda mais importante do metal nacional e uma das mais importantes no cenário mundial. O grupo começou em Belo Horizonte, formada pelos irmãos Max e Igor Cavalera. Juntaram-se a eles Jairo e Paulo, gravaram dois discos (Bestial Devastation e Morbid Vision) e foram considerados a pior banda do mundo pela revista Kerrang. Situação que mudou radicalmente com a entrada de Andreas Kisser no lugar de Jairo. Foram mais cinco álbuns (Schizophrenia, Beneath the Remains, Arise, Chaos A.D., Roots) e o reconhecimento internacional. O conto de fadas parecia que iria acabar com a saída de Max da banda. Um novo vocalista e um novo álbum vieram (Against). Ao contrário do que muitos pensavam o Sepultura esta mais vivo que nunca e se preparam para mais um ataque sonoro: vem aí Nation. É com Andreas Kisser que conversamos. 


O que o você esperava quando se juntou a Max, Igor e Paulo? O que te impressionou a ponto de querer entrar na banda?
Na época o Sepultura em relação a outras bandas, era a que tinha mais chances de conseguir alguma coisa. Com o apoio da família o Max, o Igor, o Paulo e o Jairo praticamente largaram tudo para acreditar no sonho deles. Comigo não era diferente, eu tinha uma banda, e também tive o apoio da família quando decidi mudar para Belo Horizonte. Essa atitude do Sepultura de meter as caras, tocar fora do estado e até do país, era o que eu estava procurando. Eu estava em Belo Horizonte quando eles perderam o Jairo, e procuravam um substituto. Eles tinham uma influência mais punk, mais death metal enquanto eu tinha a influencia de heavy metal tradicional, e assim a gente construiu o estilo do Sepultura.

É verdade que vocês tocaram de graça no Rock in Rio II?
É verdade. O Rock in Rio, foi importantíssimo para o Sepultura no Brasil, abriu as portas da mídia, mostrou que o tínhamos qualidade e público. O show do Rock in Rio foi maravilhoso apesar de termos tocado só 30 minutos, foi a primeira vez que o Orgasmatron teve um puta impacto. Foi uma oportunidade única, não podíamos perder a chance.

O som do Sepultura foi se modificando ao longo dos anos, hoje muito mais pesado do que rápido, soando como o novo metal, o Metallica e o Megadeth viraram pop. O thrash metal acabou?
Acho que não. É só uma conotação, a gente nunca gostou de ser chamado de speed, de thrash. Sempre tentamos fazer uma música original sem se prender a estilo nenhum e essas divisões nunca preocuparam a gente. Fazendo som pesado ou rápido, era som do Sepultura, é problema dos outros catalogar e colocar em diferentes pastas.

Atualmente vocês utilizam muita percussão, gravaram com os Xavantes e com Carlinhos Brown. Quando o Brasil passou a ser uma referência musical?
Desde o momento que a gente passou a viajar para fora do país, em 89 a partir do Beneath the Remains, a gente foi vendo o Brasil com olhos diferentes, respeitando mais o lance daqui. Antes detestávamos tudo daqui por não sermos respeitados por nenhuma facção, a não ser pelo underground. Queríamos mesmo chocar, nosso som era nosso som e todo mundo que se foda, e nós sempre batalhamos por isso. Saindo do Brasil, a vimos que tinha muita coisa que poderíamos explorar sendo brasileiro. A parte de percussão todo brasileiro tem, até dormindo, e qualquer um pode aprender. Nascemos ouvindo carnaval, na rádio e em todo e qualquer lugar, em mesa de bar sempre tem neguinho batucando. Isso é uma coisa natural para o brasileiro, e resolvemos explorar isso, usar do estilo Sepultura e utilizar estes instrumentos. Procurar coisas novas, um desafio novo, para que a música pudesse estar rica, algo que ninguém escutou antes.

Seus solos se tornaram mais curtos, com muita variações de timbres. Os dedilhados perderam espaços aos riffs. Porque essas mudanças?
Eu fiquei meio de saco cheio de solo tradicional que todo mundo estava fazendo, principalmente na época de Malmesteen, que todos tinham que fazer arpejo, senão, não era guitarrista. Eu me afastei desse povo, dessa competição escrota, que é uma coisa até nociva para a sua própria música. A música tem que ser livre, ser aberta não pode seguir tendências ou obrigatoriedades, e ao mesmo tempo descobrimos a percussão e eu fui jogando meu solo para o lado mais percussivo, mais acordes, pesquisando timbres como você falou e usando a guitarra de uma maneira diferente. Explorar é sempre saudável.

Ao que parece vocês tem problemas com empresários. Depois da Glória, vocês já trabalharam com os empresários do Motorhead e agora com Rick Sales (Slayer)...
Quando Max saiu ele levou toda a estrutura. Estávamos com a Glória desde 1990, foram seis anos que a banda cresceu muito e haviam certos vícios no contato dela com a gravadora, aquilo tudo ruiu, tivemos praticamente que começar do zero. Na época ninguém acreditava no Sepultura, para todo mundo o Max iria seguir a carreira e a gente iria desmontar e sumir do mapa. Todo mundo pensou isso: a gravadora, os fãs e os empresários. Foi aí que apareceu o Todd e o Alex, dois caras que acreditaram e queriam empresariar a banda ainda como um trio, fazendo som e ensaiando em San Diego. Depois que a turbulência passou acho que a principal função deles foi man-ter o Sepultura vivo, ajudar a encontrar o Derrick, gravar o disco "Against" e fazer turnê em vários países. Na parte política vimos que o Todd e o Alex não tinham a força que precisávamos. Resolvemos mudar, estamos com Rick Sales, empresário do Slayer. Ele já foi tour manager do Metallica no Ride the Lightining, tem uma carreira por trás, uma organização e um poder político muito mais forte e ele estava afim de empresariar o Sepultura nessa época. Foi uma transição natural.

Incluir Derrick na banda foi uma tentativa de expandir no mercado americano? Houve pressão da Roadrunner?
Na verdade a Roadrunner detestou o Derrick, todo mundo detestou o Derrick. Mas a gente acreditou nele, sentimos seu potencial, fizemos vários ensaios com ele no Brasil e fizemos ensaios com outros vocalistas, e o Derrick foi o que mais trouxe ele mesmo, não tentou imitar o Max ou o Phil Anselmo. Todo mundo ficou contra porque o cara era negro. Se fosse pela gravadora os caras escolheriam um cara branco, os americanos são muito racistas. Quanto a ele ser americano foi uma consequência. O Derrick é um americano que não tem nada haver com os Estados Unidos, é um cara que fala um pouco de alemão, morou na Europa e em Nova York que é uma capital mundial que tem todas as culturas e tendências. É um cara de cabeça aberta, que tá afim de aprender, já está falando bem o português, gosta do Brasil e pessoalmente ele se encaixou perfeitamente com a gente.

E como foi a receptividade do público ao disco "Against"?
Foi superpositiva. Lógico que teve quem não gostou, como em todos os discos do Sepultura. Não dá para agradar a todos. Against foi uma batalha, tivemos que lutar muito para lançá-lo, brigamos com a gravadora e com todo mundo, ninguém acreditava no Derrick. Tivemos que passar vários obstáculos e foi um período de muito aprendizado. Crescemos muito como pessoas e como banda.

Vocês fizeram uma tour com o Metallica na América do Sul, e ouvi dizer que tiveram pro-blemas com o som em relação ao do Metallica. Pode falar a respeito?
É natural a banda de abertura não tem 100% de som e luz que tem a banda principal, em qualquer parte do mundo, qualquer banda ou festival. No Rio foi legal, em Porto Alegre foi muito bom, a gente teve um som decente que precisaria para fazer um show daquele porte. Em São Paulo que foi o maior público, sentimos que o nosso som foi realmente boicotado. Acho que estávamos apenas com dez por cento do som. Para falar a verdade não sei a razão, não sei se partiu da banda, ou se foi uma coisa individualista de algum roadie, de algum técnico.

Por que decidiram gravar "Nation" no Rio de Janeiro?
Porque é Brasil. Gravamos o Beneath de Remains no Rio, que foi uma puta experiência, o Rio tem vários estúdios bons e não tem o trânsito caótico de São Paulo. Todo dia a gente podia ir pro estúdio andando. Foi para se concentrar mesmo no disco e nos afastar deste caos que a gente estava desde agosto, ensaiando e escrevendo o disco aqui em São Paulo. Foi uma mudança de ambiente.

Quais as expectativas para Nation?
Muito mais organizado, com a vida no lugar. O Derrick esta super bem entrosado com a banda, assim como pessoalmente, ele participou desde o marco zero do disco, compondo com a gente, com guitarra, vocais e letras. Estamos nos sentindo como banda mesmo, muito mais concentrado na música em vez de ficar pensando em achar empresário, em achar vocalista...

Os fãs ainda podem sonhar com a volta de Max ao Sepultura?
Sonho todo mundo pode ter, sonho é uma coisa livre. Podem sonhar o que quiserem, até com o impossível, que é a volta do Max hoje em dia.

* por Eduardo de Souza 

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